O que esperar de cada dia da Trilha Inca
- Carol Ussier
- 18 de fev. de 2017
- 7 min de leitura
Quer saber como é o percurso em cada dia da trilha? Eu dediquei esse post ao meu relato pessoal, contando as dores e as delícias de cada dia. Afinal, cada dia é completamente diferente do outro. Chega mais!

Dia 1 - O MAIS FÁCIL
Apesar de ser o dia com o maior trecho, também é o que tem o menor declive. Aproveite esse dia para aquecer =).
6:30 - me buscaram no hotel e eu entrei na van e conheci meu grupo. Éramos em 3 turistas apenas - eu, a Carol e o Diogo, também brasileiros. Nosso guia era o Mario e além dele tinha 1 cozinheiro, 1 ajudante de cozinha/portador e 1 portador. 8:30 - ainda em Cusco paramos para o guia/cozinheiro pegarem alguns suprimentos e por volta desse horário chegamos em Ollantaytambo, onde tomamos café da manhã - bem reforçado para termos energia. Aproveitamos esse momento também para comprarmos os nossos próprios suprimentos: 1 garrafa de água, barras de cereal, barras de chocolate (me ajudaram muito!), folhas de coca e caramelos de coca.

9:30 - chegamos ao início da trilha (km 82). Antes de começarmos tivemos um pequeno tempo para nos arrumarmos: passar protetor solar, colocar o boné, decidir com quais camadas de roupas íamos e ajustar os bastões. Nós 3 decidimos carregar nossas próximas mochilas no primeiro dia. Andamos alguns metros, cruzamos o trilho de trem e chegamos ao posto de controle de entrada.
10:00 - por volta de 10h passamos pelo posto de controle. ERA O COMEÇO OFICIAL!. Essa ponte marca o início da trilha, que já começa com uma pequena subida. Depois dela o caminho fica por um bom tempo bem tranquilo: plano, com sombras e sem degraus.
Começo oficial da Trilha Inca.
12:00 - acho que era para almoçarmos nesse horário, mas ao invés disso ficamos uma meia hora tentando entrar em contato com nossa equipe de suporte (pelo o que eu entendi eles pegaram muita fila na entrada e por isso não chegaram a tempo de fazer nosso almoço). Bom, acontece. Seguimos caminhando.

13:00 - depois de mais 40 min por um caminho bem tranquilo chegou o primeiro desafio: uma subida bem íngreme em uma encosta. E depois dela a primeira recompensa (sítios arqueológicos). Passeamos um pouco pelos sítios e seguimos andando. Essa parte do trajeto, após os sítios, é na verdade bem tranquila. Mas para mim foi a mais difícil de todas (provavelmente porque estava sem energia, já que não almoçamos).
16:00 - chegamos ao primeiro acampamento (Huayllabamba a 3.000 m de altitude), com o almoço nos esperando. Depois do almoço dormimos - eu em uma barraca e Carol/Diogo (que eram um casal) em outra - e só acordamos para o jantar. 20:30 - Jantamos e logo depois fomos dormir novamente (o cansaço + frio ajudam a dormir bem cedo).
Dia 2 - O MAIS DESAFIADOR
Eu já tinha ouvido dizer que o segundo dia era o dia mais difícil (e realmente é) e durante a primeira noite eu senti muita dor no meu ombro (afinal, eu estava com uma fratura no úmero e não sabia). Por isso nesse dia eu optei por pagar um portador para carregar a minha mochila (100 soles). 6:00 - fomos acordados pela equipe de suporte, com uma bacia de água quente em frente à barraca e uma xícara de chá. 6:45 - com café da manhã tomado, voltamos a caminhar. A trilha já começa com subida - e assim permanece por muitas horas. O primeiro trecho de subida é ainda em mata semi fechada e acho que durou 1h, até chegarmos em um novo posto de controle. 7:45 - depois de passarmos pelo posto de controle, continuamos subindo. Agora o trecho, que ainda tinha bastante sombra, também tinha vários degraus. Nesse momento também começamos a cruzar com mais grupos.

8:45 - chegamos ao primeiro ponto de descanso. Esse é um momento importante de parada, pois é um dos poucos lugares que tem banheiro (latrina, claro) e também o último lugar onde é possível comprar água durante o segundo dia. Eu aproveitei para comer uma maçã, tomar um gatorade e colocar novas folhas de coca na boca.
9:00 - início do pior trecho de todos e também o mais gratificante. Do ponto de parada é possível ver o cume onde temos que chegar - chamado de Warmihuañusca, ou “passagem da Mulher Morta”. São aproximadamente 1,8 km e 450 metros de desnível e não existe nenhuma plataforma plana onde você possa descansar. Parando para pensar, o trecho anterior é mais longo do que esse e também com um desnível maior (800 metros). Porém quanto maior a altitude, mais difícil vai ficando. Esse foi o momento em que me permiti ir no meu próprio ritmo. Andava 20 metros, parava 15 segundos, mais 20 metros, e mais 15 segundos parada. E assim aos poucos fui subindo. Acho que ao longo dessa subida eu troquei umas 3 vezes as folhas de coca na boca e também chupei uns 3 caramelos de coca. Muitas pessoas passaram por mim e eu fui ficando cada vez mais na turma do fundo. Mas não desisti.. eu sabia que iria chegar em algum momento.
12:00 - cheguei no topo, no ponto de maior altitude de toda a trilha! E é impossível descrever como me senti confiante depois de chegar nesse lugar. Tiramos algumas fotos, comemoramos a conquista de mais um desafio, ajustamos os bastões e começamos a descer! Da passagem da mulher morta até o acampamento do 2o dia são 2,4 km de descida. Para mim a descida foi super tranquila - pois o meu problema é a falta de ar (que piora na subida). Porém algumas pessoas acharam a descida a pior parte e por uma bela razão: para descer são degraus que chegam a ter 1m de altura.

13:30 - chegamos ao acampamento =), que dessa vez tinha latrinas e pias. O almoço estava praticamente pronto e a programação foi a mesma do dia anterior: almoço, dormir, jantar, dormir.
Dia 3 - O MAIS BONITO
A partir desse dia voltei a carregar a minha mochila novamente =). 7:00 - acordamos, com bacia de água quente, xícara de chá e depois café da manhã. 8:00 - começamos a caminhar. A primeira metade do 3o dia é como se fosse uma miniatura do 2o dia: tem uma subida bem íngreme e depois uma descida também íngreme. A grande diferença é que nesse dia a distância percorrida durante a subida é 1/3 da do dia anterior. 10:00 - fim da subida e mais alguns sítios arqueológicos. Acho que descobrir esses sítios escondidos ao longo da trilha inca é uma das coisas que fazem ela ser tão legal.
12:00 - pausa para o almoço. O terceiro dia teve uma dinâmica um pouco diferente dos outros. Como saímos mais tarde, depois do primeiro trecho (subida/descida) paramos para almoçar em um lugar que tinha latrinas/pias. Como sempre, o almoço estava delicioso.

13:00 - voltamos para a trilha. A partir desse momento a paisagem muda completamente, pois voltamos a caminhar no meio da mata. O percurso também fica mais fácil pois não existe mais nenhum desnível tão grande (até o dia seguinte). A sensação que eu tive é que estávamos caminhando ao redor da montanha, com pequenas subidas e pequenas descidas bem tranquilas.
15:30 - chegamos ao 3o acampamento e fomos recebidos com muitas nuvens. Ouvi dizer que normalmente os grupos querem acampar mais para frente, em um lugar onde dizem haver chuveiro com água quente. Porém quando fomos, essa área estava em risco de deslizamento. E para mim foi a melhor coisa que aconteceu.
Ou você trocaria essa vista por um banho? Eu não… (as nuvens foram sumindo aos poucos e nos presenteando com uma paisagem cada vez mais bonita).
19:30 - hora de dormir! Esse foi o dia em que fomos dormir mais cedo, pois no 4o dia íamos sair ainda de madrugada. Bom, pelo menos teoricamente deveríamos dormir cedo. Para mim essa foi a noite mais difícil de todas por causa do frio e se eu dormi 1h foi muito. Eu tentei todas as posições possíveis, até sentada, para tentar achar uma forma de ter menos contato com o chão. Mas nada adiantou e eu confesso que eu até chorei. Isso porque eu estava com absolutamente todas as minhas roupas no corpo + um saco de dormir próprio para temperaturas negativas. A minha dica é: reforce com a agência que você quer um isolante térmico!
Dia 4 - O MAIS EMOCIONANTE
Antes de escrever o meu relato preciso dizer que normalmente os grupos saem do acampamento 2h da manhã nesse dia, para chegar na Porta do Sol antes do nascer do Sol. Porém o nosso guia PERDEU o horário e acabamos saindo bem mais tarde. Para mim não estragou em nada a magia… 04:00 - o guia apareceu desesperado em nossas barracas e antes mesmo de sairmos delas, os portadores já começaram a desmontá-las. Aparentemente existe apenas 1 trem por dia disponível para os portadores e se eles não corressem não iriam conseguir embarcar (afinal estávamos 2h atrasados). Acho que em 10 minutos estávamos com mochila nas costas e bastões ajustados para começar a caminhar - ainda no escuro. O início do trecho é uma descida bem íngreme, cheia de degraus altíssimos e como ainda estava escuro tivemos que dobrar nossa atenção. 06:00 - o sol começou a nascer e nós chegamos ao local onde normalmente as pessoas acampam na terceira noite. Comemos nosso lanche por ali (que foi dado pelo guia) e eu aproveitei para tirar algumas camadas de roupa. O trecho entre esse ponto e a porta do Sol é o que mais tem precipícios. Mas mesmo com toda a tensão, a emoção de estar chegando ao fim é cada vez maior. 08:30 - eu lembro que estava andando sem ter a menor noção de nada. Era mais uma subida e eu estava naquele esquema de sempre: anda um pouco, para um pouquinho, respira, volta a andar. Não dava para ver o que tinha ao final da subida, mas aparentemente as pessoas estavam virando para a esquerda. O guia surgiu no topo, olhou para mim e disse: "preparada para chegar onde você sempre sonhou?”. Não era possível... eu estava mesmo chegando? Até apertei os passos. Tomei fôlego e andei o mais rápido que consegui. Quando estava me aproximando do guia ele falou comigo de novo : "parabéns, você conseguiu”. Olhei para o lado esquerdo e lá estava ela: Machu Picchu! Eu estava na Porta do Sol e não tem palavras que eu use que possam explicar o sentimento que é chegar ali. Eu joguei minha mochila no chão, sentei (ou seria mais apropriado dizer que me joguei no chão também?) e minha vontade era de ficar ali para sempre.

Nós não vimos o nascer do Sol - que, sim, deve ser incrível! Mas eu hoje posso dizer que fiz a trilha de braço quebrado (eu caí na Estrada da Morte, na Bolívia =/) e - com exceção de 1 dia - carregando as minhas próprias coisas. Carol e Diogo, obrigada por terem sido os melhores parceiros de trilha possível e por terem dividido esse sonho comigo =).
Comments